As alegrias da maternidade, de Buchi Emecheta: esse foi o primeiro livro que comprei na Tag Livros, logo que soube que o lançamento do mês seria uma indicação da Chimamanda Adichie e que a escrita seria de uma autora nigeriana inédita Brasil. A combinação me fez apostar nessa compra-suspense (a Tag nunca revela qual será o título até o mesmo ser enviado pra casa dos assinantes), que resultou num dos melhores livros que já li e com um projeto gráfico sensível e forte como o texto.
Ao contrário do nome, o livro traz um relato cruel do destino dado às mulheres, na Nigéria colonial da primeira metade do século XX: ser mãe. Some a isso um cenário de relações opressoras, tanto do homem sobre a mulher, quanto do colonizador inglês sobre todos, transformando os valores de uma terra que não lhe pertencia. Nos dois casos, essa sempre através de relações de poder impostas pela violência.
Nascida em 1944, na cidade yorubá de Lagos, a escritora passou a infância em Ibuza. Segundo matéria no blog da Tag:
“uma das paixões da menina era ouvir histórias dos mais velhos. Em Lagos, conheceu bons contadores, mas, para ela, a maneira igbo era diferente. Cresceu ouvindo a tia, a quem chamava de Grande Mãe — as contadoras, seguindo a tradição local, eram sempre mães de alguém. Buchi costumava sentar “por horas a seus pés, hipnotizada pela sua voz de transe”, deleitando-se com as proezas de seus ancestrais. As visitas a Ibuza, aliadas ao prazer e ao conhecimento obtidos com as narrativas, trouxeram a Emecheta a certeza de que seria, também, uma contadora de histórias.”
Buchi casou-se cedo, aos 16 anos e viveu um casamento abusivo. Antes dos 20 anos, se mudou pra Londres, onde ingressou na faculdade e escrevia nas horas vagas. Seu ex-marido, violento, chegou a queimar um de seus livros. Aos 22 anos, ela se divorciou e ele renegou a paternidade. Para se manter e cuidar dos cinco filhos em uma cidade estranha, trabalhou em lugares como a Biblioteca de Londres, enquanto mantinha os estudos. Formou-se em 1974, em Sociologia.
Trabalhou como colunista no New Statesman, periódico inglês, depois como assistente social, quando foi morar em Nova Jérsei. Lançou 4 livros: Na Vala, O preço da noiva, A pequena escrava e As alegrias da maternidade, escrito após a decepção em saber que sua filha mais velha iria morar com o pai. Justamente este foi seu livro de maior repercussão. Escrito em 1979, somente ganhou tradução em 2017, mesmo ano que Buchi se despediu desse mundo.
Sua obra questiona, dentre outros temas, a educação destinada à mulher, a valorização da maternidade como única preocupação possível, a violência do colonialismo e a cultura que tira a autonomia. “Existem milhões de mulheres africanas que nunca deixam suas casas, nunca deixam seus vilarejos; esposas em vilarejos continuam na escravidão. Quanto aos meus livros, eles podem ser positivos, ou podem ser negativos. Mas eu acredito que se você cria uma heroína, seja africana ou europeia, com educação — não necessariamente com dinheiro, mas educação — ela ganha a confiança para poder lidar com o mundo moderno”.