Essa foi minha maior lição de 2018: entender que não somos todos iguais (e viva a diferença!), mas somos todos um. Não foi um aprendizado do nada, não veio no primeiro dia do ano. Veio agora como frase clara, enquanto eu pensava sobre o que um monte de coisa que tenho lido, ouvido, visto e sentido e como cada uma delas têm me afetado. E demora pra achar as palavras que encaminham saídas pela boca, para, então, virarem verdades que muitas vezes dispensam barulhos.
Em 2018 eu me recolhi. E não foi um recolhimento por tristeza. Foi por necessidade de me ver mais de perto. E a solitude ganhou coroa dourada. Quando me vi, me percebi diferente. Muita coisa do que vinha vivendo era um fluxo que não era meu. Em março, mudei de emprego e achei um lugar onde a escuta ativa funciona. Onde o tempo é conjugado em verbo. E onde palavra é válida. Com isso, veio muito à tona.
Percebi o quanto, há tantos anos, andava acelerada, preocupada, rígida, tensa, crítica além da conta porque obedecia a urgências, vazios e valores de empresas que não eram condizentes com uma relação saudável. E aí veio outro pensamento: que saúde tem muito, muito mais do que eu pensava, a ver com o ambiente onde você trabalha. Porque, sim, eu acho impossível separar trabalho de vida pessoal. Assim como não acho que exista uma vida online e outra offline. É tudo uma coisa só, porque você é uma pessoa só. Seus interesses, seus valores, sua maneira de falar com os outros, a sua maneira de se fazer presente no mundo anda com você. Tudo isso é você. Não é uma bolsa que você deixa em uma sala, enquanto sai para almoçar.
Olhando para isso tudo, tive que me visitar no passado para entender o que era esse agora que eu tanto quis e estava vivendo. Sim, ele é possível. E isso também me deu medo durante um tempo. "Será que em algum momento vai cair a cortina do Truman e vou me decepcionar?" E aí vi o quanto andava frustrada com antigos trabalhos, por mais que tenha desenvolvido projetos com minha concepção, projetos em que acredito e que tenha feito tudo que eu achava de melhor por onde passei, foram poucos os lugares por onde andei nesses 16 anos de carreira que eu pudesse dizer que eram lugares coerentes, éticos, que me dessem paz e fossem sustentáveis. Ah, sim, tem essa questão forte pra mim de como o sustentável tomou uma forma na minha vida.
Este ano foi quando entendi e verbalizei que, para mim, sustentabilidade começa nas relações. Em se falando de trabalho, desde a forma com que você é contratado, até o bom dia de manhã, passando pela forma com que é cobrado pelas suas funções, como é reconhecido (existem elogios? Críticas construtivas?), o quanto seu aprimoramento pessoal é valorizado e o quanto é encorajado a tomar decisões (como é visto o erro atualmente na empresa onde você está agora? Aprendizado ou falha grave? As pessoas são demitidas por tentarem ser realizadoras ou elas são orientadas?). Tudo isso importa.
Ainda em sustentabilidade, a palavra também se enraizou nas minhas decisões sociais, de companhia, saídas e afins. E tudo isso casou com um olhar para o autocuidado, que se tornou mais forte já agora no fim de 2018, quando, lendo uma jornada especial da Comum sobre o tema, entendi que muito do que eu fazia comigo mesma era indulgência e não autocuidado. "Putz, tô tão cansada hoje que preciso de um chope". Várias vezes isso resultava em uma noite mal dormida ou em adiar alguma reflexão. Quando me dei conta disso, dei um clique. Abriu uma luz (e uma sombra que tem sido trabalhada).
Por isso, muitas e muitas vezes este ano troquei o chope por um filme, um livro, cozinhar, meditar, brincar com minhas gatas, um banho demorado ou uma dupla de escalda pé e chá. Troquei encontros por literalmente ficar quieta. Me dei direito a reservar muito — muito — tempo para me ouvir. Disse não inúmeras vezes. Deixei de encontrar pessoas queridas, mas porque precisava silenciar o de fora e botar um alto falante aqui dentro. E, hoje, quando acontece o dia de chope, ele não é mais uma fuga ou escape. A consequência de não ter também esse "fator alterador" no organismo foi entender também como meu corpo estava funcionando agora.
O resultado? Hoje, acordo às 05:30h e 22h estou na cama. Não consigo mais comer muita carne (à noite, nem pensar). Vi o quanto a lactose influencia na minha rinite alérgica e asma, assim como amendoim (pois é, nunca tinha me ouvido em relação a isso). E, assim, estou achando novos programas e diversões reais, saindo de padrões de hábito, que nada mais têm a ver comigo.
Do que me desliguei: de tudo que me intoxica, como criar relações com pessoas que não somam; de empurrar minha própria responsabilidade de decisões; de incoerências extremas, onde a fala não condiz com os atos; de todas as situações onde o diálogo não era possível por severa discrepância de valores. Tentei fugir de assuntos vazios, pequenos, que têm como pretensão expor uma opinião a partir da inferiorização do outro. Esse ano pedi muito que eu tivesse presença de espírito e ela apareceu em momentos importantes, impedindo que eu repetisse um antigo padrão de levar pra casa bagagem que não cabe mais no meu armário — o que acontecia muito comigo em relação a pessoas que eu gosto/ava, de amigos a amores. Muitas vezes nos calamos para algumas coisas, com medo de melindrar relações, permitindo com que o outro fale o que quer, enquanto guardamos mágoas e chateações, ficando cada vez mais sem voz. Se um fala e machuca o outro, este outro têm seu direito de reposta. Que fique claro e cada um se responsabilize pela fala que sairá da sua boca. Começando por mim.
E a palavra… essa veio pra marcar meu ano. O REFLETE virou coleção de livros e já caminha para novos projetos. Com isso, consegui retomar a minha escrita. Também aprendi a bordar. Relembrei o quanto sempre fui boa com artes manuais (quem sabe agora volto a desenhar) e fiquei feliz com que produzi. Estudei muito. Fui ao meu primeiro TEDx, evento que mais admiro (obrigada, Tola e Marco). Conheci poucas e ótimas pessoas incríveis. Conversei muito. Ouvi muito. Dentro e fora. Dancei menos do que queria, mas fui ao show do David Byrne (obrigada, Rick). Chorei muito. Em casa, no metrô, a pé. Vi séries, filmes e até fui ao teatro e acabei de conseguir ouvir, pela primeira vez, um podcast inteiro, de 1:40h (quem me conhece, sabe que as duas últimas modalidades não são a minha. Mas, obrigada, Betho e Mary, por insistirem que eu ia curtir). Aprendi muito. E mais que tudo aprendi que somos todos diferentes — o que nos torna únicos — e somos todos um só. Que as conexões continuem gerando novas galáxias. E que a gente saiba escutar o planeta que vai dentro do nosso coração.