Pra lembrar porque navios são construídos: Clarissa Pinkola Estés

REFLETE
4 min readMar 28, 2020

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“De dentro do meus ossos, sei de algo, assim como você.”

Arte de Obey Giant

Li esse texto mais do que necessário, da Clarissa Pinkola Estés, ontem no Insta da Go,Writers. Li, reli, li em voz alta. E continuo lendo. Divido aqui:

“Não desanimem. Nós fomos feitos para esses tempos. Muitos têm dito, recentemente, que estão profundamente e adequadamente confusos. Que estão preocupados com a situação atual em nosso mundo agora. Vivemos um tempo de espanto quase diário e, com frequência, de raiva sobre as mais recentes degradações do que é mais importante para as pessoas civilizadas e visionárias.

Você está certo em suas avaliações. O brilho e a arrogância que alguns aspiram ao endossar atos tão hediondos contra crianças, idosos, pessoas comuns, pobres, desprotegidos e desamparados são de tirar o fôlego. No entanto, peço-lhe, gentilmente: não deixe o seu espírito secar ao lamentar esses tempos difíceis. Especialmente, não perca a esperança. Porque é fato: fomos feitos para esses tempos. Sim. Durante anos, aprendemos, praticamos, treinamos e apenas esperamos nos encontrar neste exato plano de envolvimento.

Eu cresci nos Grandes Lagos e reconheço uma embarcação em condições de navegar, quando vejo uma. Em relação às almas despertadas, nunca houve embarcações mais capazes do que as que existem agora em todo o mundo. E eles são totalmente provisionadas e capazes de sinalizar umas às outras, como nunca antes na história da humanidade.

Olhe para a proa; há milhões de barcos de almas justas nas águas com você. Mesmo que suas vigas possam tremer, a cada onda, neste furacão tempestuoso, garanto que as longas madeiras que compõem sua proa e leme vêm de uma grande floresta. Sabe-se que a madeira serrada de grãos longos suporta tempestades, se mantém unida, se mantém própria e avança independentemente.

Em todo momento sombrio, há uma tendência em se debruçar sobre tudo que está errado no mundo. Não se concentre nisso. Também há uma tendência a se enfraquecer, insistindo em fazer o que está fora do seu alcance. Não se concentre nisso. Isso é gastar o vento sem levantar as velas.

Somos necessários, é tudo o que sabemos E, embora encontremos resistência, mais encontraremos grandes almas que nos saudarão, nos amarão e nos guiarão, e as conheceremos quando aparecerem. Você não disse que tem fé? Você não prometeu ouvir a voz maior? Você não pediu graças? Você não se lembra que estar em graça significa submeter-se à voz maior?

A nossa tarefa não é consertar o mundo inteiro de uma só vez, mas esticar-nos para consertar a parte do mundo que está ao nosso alcance. Qualquer coisa, mesmo que pequena, que uma alma possa fazer para ajudar outra, para ajudar parte desse pobre mundo de sofrimento, ajudará imensamente. Não cabe a nós saber quais atos ou quem fará com que a massa crítica se incline para um bem duradouro.

O que é necessário para uma mudança dramática é um acúmulo de atos, acrescentando, acrescentando, adicionando mais, continuando. Sabemos que não é preciso que todos na Terra tragam justiça e paz, mas apenas um grupo pequeno e determinado que não desistirá durante o primeiro, segundo ou centésimo vendaval.

Uma das ações mais calmantes e poderosas que você pode fazer para intervir em um mundo tempestuoso é se levantar e mostrar sua alma. A alma no convés brilha como ouro nos tempos sombrios. A luz da alma lança faíscas, labaredas, dá sinais de incêndio, faz com que assuntos apropriados peguem fogo. Acender a lanterna da alma em tempos sombrios como estes, ser feroz e demonstrar empatia são atos de imensa bravura e maior necessidade.

As almas em sofrimento captam a luz de outras almas que estão totalmente iluminadas e dispostas a mostrar-se. Ajudar a acalmar o tumulto é uma das coisas mais fortes que você pode fazer.

Sempre haverá momentos em que você se sentirá desencorajada. Eu também já senti desespero muitas vezes na vida, mas não mantenho uma cadeira para ele. Eu não vou entretê-lo. Não permito com quem coma do meu prato.

A razão é a seguinte: de dentro do meus ossos, sei de algo, assim como você. É que não existe desespero, quando você se lembra porque veio à Terra, a quem serve e quem o enviou aqui. As boas palavras que saem da nossa boca e as boas ações que fazemos não são nossas. São as palavras e ações daquele que nos trouxe aqui. Dentro desse espírito, espero que você escreva isso no seu muro: quando um grande navio está no porto e está atracado, ele é seguro. Não há dúvidas. Mas não é para isso que grandes navios são construídos.”

Por Clarissa Pinkola Estes, poetisa americana, especialista em pós-trauma e psicanalista junguiano, autora de Mulheres que correm com os lobos. O texto é tirado do livro Clear and Present Danger: Narcissism in the Era of President Trump: Revised Edition. Obrigada, Cris Lisbôa, pela inspiração diária.

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