Sempre admirei pessoas que conseguem fazer afluentes de força e delicadeza (não seria a delicadeza uma força? - me pergunto agora). E foi isso que me impactou muito na arte feminista da Pri Barbosa, com quem conversei virtualmente, nessa quarentena, pro REFLETE, sobre arte, política e empreendedorismo. O nosso bate-papo vocês podem ler abaixo.
REFLETE: Uma vez vi uma entrevista sua em que falava sobre a transição entre sair de uma agência e se dedicar ao seu próprio negócio. E que, como empreendedora, você percebeu as cobranças que colocava sobre você mesma, mesmo já trabalhando em home office, de acordo com seus horários. Vejo muito isso como um sintoma de um universo machista e capitalista, onde as diferenças não são respeitadas e é considerado “bacana” ir além dos limites, ainda que isso aconteça, algumas vezes, de maneira subliminar. Passados alguns anos, como você busca o equilíbrio entre o que acontece lá fora e o seu ritmo?
PRI BARBOSA: Sobre o equilíbrio, é uma busca constante. Tento ao máximo separar vida pessoal de vida profissional e isso incluir traçar alguns limites difíceis de lidar, como quantidades de horas trabalhadas e flexibilidade de horário de trabalho. Tudo isso é complexo, porque, quando todo seu “negócio” está relacionado à sua própria produtividade, é muito fácil se render à culpa, quando existem momentos de ócio. Esse tem sido meu grande exercício.
REFLETE: Como você vê o cenário de empreendedorismo feminino no Brasil, dentro da arte?
PRI BARBOSA: Eu vejo que a arte e xs artistas num geral não são vistos como empreendedores, até porque ainda temos uma cultura que tem dificuldade de entender arte como uma carreira. Por isso, a gente fala tanto sobre ser artista independente, sobre fortalecer o corre de outrxs artistas, entende? Aprendemos muito com as experiências que trocamos. Falando de mulheres, a inserção nessa troca ainda tem que ser exigida, conquistada. Temos que sempre nos colocar nos espaços e muitas vezes, provar que temos a capacidade de estar lá. A arte é um mercado, assim como tantas outras áreas, nossas dificuldades em termos de representatividade, em diferentes áreas, conversam muito.
REFLETE: Sei que continua produzindo nesses dias e queria falar sobre seus novos projetos. Sua arte sempre traz posicionamentos e reflexões para o que é latente: a igualdade dos corpos, a liberdade do ir e vir, a necessidade de olhar o entorno. Como nasceu o projeto com o MTST? Vocês já tinham uma parceria?
PRI BARBOSA: Eu tenho sempre muitos projetos ligados a ações sociais de diferentes setores, mas, nesse momento de pandemia pelo Covid-19, achei que o mais coerente da minha parte seria fazer algo ligado ao movimento de luta por moradia.
Em tempos de slogans como “fique em casa”, é importante ressaltar que não é todo mundo que tem acesso à esse direito, que por sinal seria um dos mais básicos. Bato bastante na tecla de lutas em conjunto ao MTST e ao MST, porque admiro demais o movimento e o posicionamento político. Prefiro sempre incentivar que o público entenda que não é só doar algo, é defender uma causa, é se posicionar.
REFLETE: Ainda em cima disso, como você vê o papel da arte nas transformações sociais?
PRI BARBOSA: A arte é sempre política, mesmo quando se isenta é política. A isenção pode ser vista como um posicionamento.
O artista é um pensador, existe toda uma pesquisa por traz das criações, uma linha de pensamento. Nosso contexto político, social, econômico e etc. são influências muito fortes no que propomos ao público e a arte tem um potencial gigantesco de levantar questões e provocar reflexões. A gente pode discutir arte com qualquer pessoa — criança, idoso, com ou sem formação… — basta saber mediar e estar abertx.”
REFLETE: O isolamento social nos coloca em sintonia com a gente mesma: luz e sombras. Focos, desfocos. Em tempos de quarentena, qual tem sido a sua maior reflexão?
PRI BARBOSA: Sigo aprofundando minha pesquisa sobre biopolítica, agora estendendo o assunto e o relacionando à situação de isolamento. Todo esse contexto traz um novo olhar para o controle e disciplina que os são aplicados.
REFLETE: Para fechar, sempre peço que mulheres indiquem outras 3 mulheres que admira, pra roda continuar a girar. Quem tem te inspirado nos dias de hoje?
PRI BARBOSA:Sonia Guajajara; Sabrina Fernandes, do Tese Onze; e Pabla San Martin, autora chilena.
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