Sobre como as concorrências começam como uma brincadeira e geram baixa autoestima — e ausência de espaço — durante toda uma vida
-Quem você acha a mais bonita de todas do Peaky Blinders?
-Acho a Polly.
-Ah, não, para… a Grace é mais bonita.
Esse diálogo simples aconteceu em uma cozinha, eu e uma amiga, tomando café, de pijamas. A conversa começou com a gente falando sobre a trama da série, até ela me fazer essa pergunta. A minha primeira reação foi de estranhamento, porque — aí me toquei — tem tempo que não participo de conversas que giram em torno de beleza nesse sentido tão simplório (preso ao físico) ou de comparação, principalmente, falando sobre mulheres.
Eu fiquei pensativa. Refletindo (até a hora de fazer este texto). Ainda existem realmente pontos de partida de opiniões onde esse é o mote essencial: quem é mais bonita. E existem depois as argumentações — como se fossem necessárias, gosto é gosto, né? — sobre algum desagrado(?) com a visão do outro sobre o que é belo. Como se uma opinião devesse prevalecer sobre a outra.
Tudo isso me fez pensar que justamente é esse tipo de abordagem que a gente deve evitar e desde cedo. Não é sobre deixar de falar sobre o que é belo, o que nos chama a atenção e sobre nossos gostos. Mas, entender que o que a gente acha sobre o físico de uma pessoa não deve ser um julgamento em nenhum aspecto, não deve ser um medidor de superioridade. E que não deve ser a única coisa falada sobre uma mulher.
Essas comparações começam no colégio, durante o recreio ou sala de aula. E, geralmente, na pré-adolescência, época onde o corpo da menina começa a mudar e mil questões surgem. Lembro de, aos 12 anos, responder uma enquete na sala onde a pergunta era exatamente essa que abriu o post: “Quem você acha mais bonita: a Patricia ou a Amanda?”. Além da disputa entre as duas por um reinado imaginário, ainda existiam os grupos divididos em suas opiniões.
Ainda em cima dessa reflexão, a gente consegue facilmente entender o link entre essas perguntas e as capas de revista que vemos hoje : “Como ficar linda para o verão.” “Emagreça 10 kg em 1 semana”. “Conheça o exercício para conquistar o bumbum dos sonhos”. Tudo isso parte de um julgamento do quê é ser linda, de um padrão que dizem que você deve seguir, por ser o “certo”. E 99% das vezes a capa da revista traz uma mulher que certamente você já sabe como é: branca, magra, cabelo liso, cintura marcada, peitos e bunda grandes, pernas torneadas, sem celulite, sem estria, sem olheiras. Dentes brancos, cílios longos e (agora) sobrancelhas marcadas.
Sem vida.
O recado passado é: você não é assim. Você tem que se controlar mais. Você tem que ser mais dedicada. Estar no padrão te faz melhor.
Quem cai no conto da capa de revista pensa: Não sou bonita. Não vou conseguir ser. Sou fraca. Não tenho lugar.
O resultado da conta acima: mulheres com baixa autoestima e facilmente controladas.
Acreditar em um padrão tira da sua frente a possibilidade de olhar a real beleza. De admirar as diferenças. De entender que cada um é um — e é aí que está a beleza da natureza. Admire (você e as outras).