um homem. um homem estupra uma mulher, durante um parto. assedia uma deputada durante uma sessão da alesp. buzina e chama de gostosa uma mulher na rua. trai sua mulher em uma festa, em meio a conhecidos dela. estupra uma sobrinha, enteada, prima. puxa pelo braço uma garota na festa. tira a camisinha no meio do sexo. se recusa a conversar sobre uma situação que machuca uma parceira e some ou a agride. não assume um filho. tem duas famílias — ou larga uma e nunca mais aparece. não divide tarefas em casa. envia vídeos pornô de adolescentes no grupo de whats ou ele mesmo faz vídeos ou fotos de parceiras e envia sem consentimento delas.
existe uma certeza enraizada de que homens podem tudo. porque aqui eles realmente podem. e podem muito.
homens escapam ilesos de julgamentos, sejam de amigos, sejam da lei. na verdade, acham apoio. porque o silêncio é conivência e de nada adianta falas como: “ele não fez por mal”, “ele é de outra geração”, “ainda estamos aprendendo”, “ele é meio bruto, mas é ótima pessoa”, “pega leve, uma hora ele vai entender, tem que ser aos poucos”. é assim que o ciclo se alimenta. é assim que as coisas escalam, porque são minimizadas, abafadas. e a gente segue andando numa areia movediça ou sendo tratada como exagerada, louca, radical. só que o que acontece é que a gente tá é muito lúcida.
no brasil, a maioria dos casos de violência contra meninas entre 1 e 14 anos acontece em casa, pelo pai, amigos ou conhecidos. 1 mulher é vítima de violência a cada 5 minutos e a cada dia é registrado 1 feminicídio. aliás, feminicídio só virou lei em 2015. sim, faz só 7 anos. por isso não dá pra parar. é tudo muito custoso, é água em pedra. estamos cansadas. tristes. violadas. feridas. tem que ser coletivo, mas parece que é só a gente (e é).
por aqui, se você é mulher, todo dia você perde um pouco de liberdade. um pouco de sono, de alegria. um pouco de vida.
arte: @marcelascheid , uma mulher-inspiração, dentre tantas que se dão as mãos.
